Na noite do dia 09 de junho, a ADEPMG realizou a live “Sistema de Justiça e Racismo Institucional”, em seu canal do YouTube. A transmissão contou com a participação do mestre e doutorando em direito pela UFMG, Deivide Ribeiro, que exerceu o papel de mediador, e ainda como debatedores a servidora da Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) e uma das organizadoras do “Samba das Pretas BH”, Camila Alves, e o defensor público e diretor jurídico e defesa das prerrogativas da ADEPMG, Maxnei Gonzaga. Juntos eles compartilharam suas histórias, desafios e lutas acerca do racismo institucional e sua manifestação dentro do sistema de Justiça e em outras estruturas do Estado.

Por mais de duas horas e com uma intensa participação do público, a live serviu de reflexão para mudanças nos comportamentos pessoais e, principalmente, demonstrou a necessidade de ações que diversifiquem a composição racial da Defensoria Pública.

Racismo em pauta

Inaugurando a discussão, o mestre em direito Deivide Ribeiro, discorreu sobre os séculos de escravidão na sociedade brasileira e questionou: “é necessário discutir racismo estrutural?”. Para Deivide, a resposta é sim: “porque ele persiste de forma silenciosa”. O doutorando em Direito relembra que “a escravidão acaba em 1888, mas a historiografia vem dizer que ela teve início mais ou menos em 1550. São 338 anos de escravidão no país, exatos 338 anos de desumanização, coisificação e reificação de pessoas a partir de um projeto que todos conhecem, a modernidade”, declarou.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apresentados durante a live, o homem branco ganha praticamente o dobro do homem negro exercendo a mesma função. Quando se compara com a mulher negra, a diferença é ainda maior, chegando a ganhar 44% a menos que o homem branco.

Na esfera da justiça os números também refletem a desigualdade. De acordo com o Grupo de Estudos Multidisciplinar da Ação Afirmativa (GEMAA) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), somente 15% dos membros do magistrado se declaram negros ou pardos, sendo 83% de pessoas brancas. No sistema penitenciário, de toda população carcerária do Brasil, 61% são homens e mulheres negras.

Mulher, preta e servidora da DPMG

Há doze anos trabalhando na Defensoria Pública de Minas Gerais e hoje ocupando o cargo de auxiliar administrativo na coordenação criminal de Belo Horizonte, Camila Alves contou que a falta de identificação com as pessoas a sua volta a afeta em seu ambiente de trabalho. Ela diz não desejar ser a única que ocupará esse espaço, mas sim mais uma de muitos. “Minhas amigas falam que eu preciso representar [as mulheres negras] mas eu não quero isso, não quero essa representatividade. O que eu quero mesmo, de coração, é proporcionalidade”, avaliou.

O pouco número de servidoras e servidores pretos e pardos negros na Instituição, de acordo com Camila Alves, precisa ser reavaliado para que seja abertos maiores espaços de diálogos. “Precisamos ser incluídos efetivamente no desenvolvimento da Instituição. Somos pessoas inteligentes e podemos contribuir muito mais para o crescimento da Defensoria Pública. Não falo de aumento salarial, mas falo de cuidado, de ter um diálogo”, disse a servidora.

Ser um defensor público negro

O baixo número de servidores negros na Defensoria Pública também se reflete nos membros da carreira, é o que aponta o defensor público Maxnei Gonzaga.  Declarando ser um dos poucos profissionais negros da instituição, o defensor enxerga essa falta de inclusão como parte do racismo estrutural existente na Instituição. “Ser preto na Defensoria Pública é se sentir diferente, é se reconhecer mais nos assistidos do que nos próprios colegas que exercem a mesma função”, declarou o diretor da ADEPMG.

O defensor público aponta caminhos que devem ser trabalhados para que a entidade se torne mais heterogênea: “vejo a necessidade de a Defensoria Pública exercer a função como educadora de direitos. Temos que ter oportunidade de ir a uma casa e debater o tema de forma ampla, segura, verdadeira, através de dados. Essa é a importância do estudo, é ali onde formamos opiniões. Com uma comunicação não violenta, demonstrar que há sim o racismo, ensinar a quem não sabe e trazer parceiros para a luta anti racista.”

Repercussão

No chat da transmissão, os espectadores comentavam e debatiam junto dos palestrantes. Um exemplo disso é o comentário da participante Monique Camilo, que usou a plataforma para manifestar sua opinião. “Os dados falam por si só. A branquitude deve repensar seus argumentos porque, para nós, racismo é ausência dos nossos espaços de poder e decisão.”

Mais pessoas também dividiram seus pensamentos sobre o tema. Confira:

Gustavo Corgosinho: “Deveria ser pensada uma ação afirmativa concreta para o acesso de estudantes de direito pretos nos quadros de estágio da Defensoria Pública. E de servidores também!”.

Viviane Barbosa: “A Defensoria deve abalar as estruturas. Amplie este debate e coloque ações em prática”.

 Alfredo Júnior: “Lamentável. As desigualdades raciais, os diferenciais de renda, saúde, emprego, educação  entre brancos de um lado e pretos e pardos de outro são gritantes”.

Fabiana Mariano da Silva: “Bela iniciativa! Por mais lives como esta. Sinto na pele a necessidade de debates sobre o racismo. Está enraizado em determinadas pessoas, é estrutural e velado. Parabéns a todos envolvidos”.

Assista

A live faz parte de uma iniciativa do Grupo Trabalho Étnico-racial, comissão desenvolvida pela Campanha Nacional da ANADEP. Para quem não pode acompanhar a transmissão ao vivo, a gravação está disponível para ser assistida no YouTube da ADEPMG (youtube.com/adepmg).

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